barris para envelhecimento de bebida

Envelhecimento dos destilados: como e por que é feito? – Parte 1

⍟ Em linhas gerais, o que é dito sobre envelhecimento de destilados em barril é que descobriu-se por acaso que os spirits ficam melhores quando envelhecidos neles. Mas, assim como na descoberta da fabricação de cerveja, fazemos um desserviço aos nossos antepassados quando ignoramos sua familiaridade com os barris e seus efeitos.

Desde o Império Romano, especificamente no século III d.C., os barris têm sido usados para transportar materiais como moedas, pregos,  azeite, vinho, frutas secas, carnes salgadas e peixes, porque protegem seu conteúdo e podem até ser usados como flutuantes (pelo menos por um tempo) se for lançado ao lado de um píer, esqui ou barca.

Talvez o fato mais importante seja que os barris foram uma melhoria dos contêineres existentes até então, que eram ânforas feitas de argila endurecida e, portanto, quebradiças em sua pouca robustez e capacidade de rolar. Um cilindro apoiado em um único ponto, o barril cheio de whisky pode pesar mais de 400 libras (cerca de 180 kg), mas uma pessoa pode rolá-lo facilmente, mesmo subindo. E os romanos também observaram que alguns drinks (por favor, tomem nota dessa palavra) melhoram dentro desses barris, sejam vinhos ou cervejas.

Se não há mais de mil anos de tradição de envelhecimento em barris para os spirits, isso deve-se mais à falta de destilado extra disponível do que a qualquer falta de vontade. Durante muito tempo, as bebidas foram armazenados em qualquer coisa em que coubessem. Como a virtude da bebida high-proof é que ela é imperecível à maior parte das coisas que a natureza e o tempo afligiriam, o modo de armazenamento não importava muito. Ao menos até o advento do comércio com o Novo Mundo, quando houve uma guinada acentuada no uso de barris de carvalho para armazenamento de bebidas alcoólicas a longo prazo.

NO SÉCULO XIV

Até os anos 1600, a maioria das bebidas embarcadas em navios com destino às Américas era consumida muito antes da chegada. Eventualmente, alguns destilados chegavam do outro lado. As potências europeias rapidamente perceberam que as grandes quantidades de especiarias que eles procuravam viajando para o oeste – lembre-se, Colombo pensava que estava viajando para o oeste para a Índia e, portanto, chamava os nativos de índios – ainda estavam muitos milhares de quilômetros além no Oceano Pacífico. Eles procuraram quais riquezas poderiam encontrar.

Barris e navios andam juntos há muito tempo. Grande parte dos que partiam neles para as colônias chegavam ao destino vazios. Aparentemente, alto mar e bebida combinam bem

Havia muitos alimentos novos e interessantes, além de alguns cativos exóticos para desfilar para a corte (ah, sim, e um pouco de ouro e prata também). Eventualmente, um pó branco emocionante e estimulante se juntou a esses produtos: açúcar. Quando você tem açúcar, você tem melaço; quando você tem melaço, você tem rum. Demoraria um pouco, porém, até que este versátil spirit cruzasse o oceano.

DIFICULDADES DE TRANSPORTE

Mas, no final dos anos 1500, havia cachaça suficiente sendo produzida no Brasil, por exemplo, para que o rei de Portugal conseguisse uma tarifa enorme pela importação de sua colônia. O mesmo tipo de prevenção seria aplicada em outros países contra seus destilados locais (por Napoleão contra as ilhas do Caribe ou no México com “Mezcal Conyac“, como alguns comerciantes chamavam), pois o método colonial sempre foi levar matérias-primas extraídas das colônias para a Europa, manufaturá-los para transformá-las em algo mais caro e os vender de volta para as colônias das quais as matérias-primas foram retiradas.

O ponto é que não havia muitos barris sendo usados para embarcar bebidas à Europa. Portanto, apesar da insistência escocesa e irlandesa de que o whisk(e)y como o conhecemos (destilado à base de cerveja com envelhecimento em barril) é uma invenção das Ilhas Britânicas, as Américas poderiam, de certa forma, reivindicar o mesmo.

O CASO DO BOURBON WHISKEY

Enquanto os colonos europeus nas Américas criavam movimentados portos a partir dos quais mercadorias e materiais podiam ser transportados de volta para casa, eles eram mais lentos para se deslocar para o interior. Mas quando o fizeram, os barris eram o tipo de recipiente preferido. Dois dos negócios de maior escala foram entre as ilhas do Caribe e os portos da América do Norte e do Sul, e entre o interior americano e o que se tornariam as comunidades costeiras atlânticas dos Estados Unidos. Até certo ponto, os spirits que faziam parte desse comércio permanecem entre os mais famosos destilados que sofrem envelhecimento em barris: rum caribenho envelhecido e whiskey bourbon.

Os barris usados na produção de bebidas alcoólicas eram frequentemente restos do transporte de vinhos ou destilados da pátria-mãe. Havia muitos barris e poucas razões para não usá-los (somente no século passado os whiskeys bourbon e de centeio foram legalmente obrigados a passar por envelhecimento em novíssimos barris de carvalho branco americano carbonizados). De fato, a maioria dos antigos destiladores já estava feliz se pudesse colocar as mãos em qualquer tipo de barril. Ainda hoje, quando indústrias dedicadas (cooperativas) existem para fornecer barris apenas para fabricação de spirits, muitos destiladores preferem barris de bourbon já usados uma vez, disponíveis em grande quantidade, já que os produtores de bourbon não podem, por lei, reutilizá-los .

A legislação exige que os barris de Bourbon sejam sempre novos. Um prato cheio para os produtores de outros destilados, que conseguem barris praticamente novos por um bom preço

TIPOS DE BARRIS DE CARVALHO

De modo geral, existem duas origens de barris de carvalho: Europa e América. Os dois possuem espécies diferentes de carvalho, e essa deve ser a menor diferença. Em vez disso, é na transformação do carvalho em barril onde os dois diferem mais. Na Europa, a tradição tem sido dividir o carvalho de veios largos no sentido dos veios, secar ao ar essas varas por dois a três anos, depois montar as varas e atá-las com aros, usando um pouco de fogo, talvez um pouco de vapor (e um pouco de força animal) para dobrar as ripas em uma forma cilíndrica. Esses métodos são ideais para vinhos brancos ou tintos, bem como para brandies.

Os carvalhos americanos são de veio mais estreito e, portanto, o tanoeiro pode serrar as varas contra o veio, conforme necessário, e não vazará. Como resultado, algumas pessoas sentem que os barris de carvalho americano (especialmente quando usados para vinho) exibem um cheiro semelhante a serragem que aparece no vinho, tanto para melhorar (pense em Zinfandel ou Shiraz) quanto para piorar seu sabor (pense em Chardonnay).

Barril sendo carbonizado
Alguns mais, outros menos, todo barril passa pelo fogo antes de ser usado

AS DIFERENTES TOSTAS DOS BARRIS

Ou o ritmo acelerado da vida americana ou o conhecimento americano poderiam ser os culpados, mas a tradição do carvalho americano era fazer seu envelhecimento por pouco tempo do lado de fora e assá-lo dentro de um forno, em vez de esperar todos esses anos para secar ao ar livre. A secagem das ripas tem dois propósitos: reduzir o teor de umidade dos barris para cerca de 12% e remover parte do caráter mais severo dos taninos e ligninas da madeira. A que é feita ao ar livre e à exposição aos elementos da natureza e estações do ano realizam ambos; a rápida, em estufa, não.

Hoje, os produtores de barril americanos estão secando ao ar livre alguns de seus barris, especialmente aqueles destinados ao vinho, por períodos maiores. Mas as diferenças persistem. E a maior delas existente entre a produção européia e americana de barris é que os de whiskey americano são severamente queimados (na verdade carbonizados) por dentro. Barris europeus e barris de vinho em geral não; são apenas levemente tostados. Isso mesmo, tostados, como um pedaço de torrada. De fato, quando você compra um barril de vinho, deve especificar o nível de torra entre leve, médio ou pesado, mais ou menos da maneira como definiria o pequeno mostrador na torradeira da cozinha.

MÉTODO DE HIGIENIZAÇÃO?

Há quem pense que os barris de whiskey americano eram tradicionalmente carbonizados internamente para esterilizá-los antes da reutilização. Como praticamente todos os bens de consumo estavam sendo transportados por barril, aquele em que você estava prestes a derramar seu precioso whiskey poderia anteriormente ter transportado alcatrão ou pregos. Melhor queimar o interior e remover todos os sabores, certo?

Barris muito antigos
Os barris eram usados para transportar tudo e alguns ficavam em uma situação realmente deplorável. Não é má ideia tacar fogo dentro para limpar um pouco antes de usar novamente.

Por outro lado, um estudo de revistas científicas no início do século XIX, quando a indústria americana de whiskey estava estabelecendo suas práticas, divulga a discussão sobre os benefícios dos barris carbonizados no armazenamento de destilados e de água, devido à interação entre o líquido e a camada de carbono purificador assim produzida. Portanto, é bem possível que os destiladores americanos, sempre muito motivados tecnologicamente, estejam apenas seguindo as melhores práticas industriais da época. E, de fato, a loja de secos e molhados estereotipada da fronteira da América sempre tinha um barril de água para que qualquer pessoa pudesse pegar um copo e tomar um pouco. O interior daquele barril também estava carbonizado. Hoje, seu copo de bourbon tem uma nota esfumaçada, de fuligem e até de queimado por causa do barril em que foi feito seu envelhecimento.

Leia a segunda parte da matéria sobre o envelhecimento dos destilados:

Envelhecimento dos destilados: como e por que é feito? – Parte 2

 

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