maría dolores boadas servindo um copo

María Dolores Boadas, a rainha da coquetelaria espanhola

⍟ Nascida dois anos depois da inauguração do bar de sua família, María Dolores Boadas era apaixonada pelo ramo da hospitalidade, cresceu entre as coqueteleiras e ficou reconhecida por seu throwing inconfundível

O ano era 1933 e a Espanha se recuperava da quebra da bolsa de Nova York anos antes. Nos Estados Unidos, imperava a Lei Seca e, além do caos social trazido pela Guerra Civil Espanhola anos depois, os catalães viviam a incerteza do período entre guerras. Naquele ano, nascia o Boadas, bar de cocktails que foi a casa e também a escola de María Dolores Boadas – conhecida mundialmente como “a rainha da coquetelaria”.

O Boadas Bar foi fundado pelo pai de María Dolores, o também bartender Miguel Boadas. Filho de imigrantes catalães, ele nasceu em Cuba e, quando jovem, trabalhou no El Floridita, um dos símbolos da coquetelaria na ilha. Por lá, aprendeu a técnica do throwing, usada para misturar e também aerar os cocktails – o Daiquiri preparado no clássico bar da Havana Vieja, por exemplo, emprega a técnica para tornar sua bebida mais leve e refrescante.

Mas voltemos a Miguel Boadas. Retornando à capital espanhola, ele decidiu abrir o próprio bar. Ali, ele poderia servir as receitas aprendidas em Cuba, além de criar suas próprias misturas. Foi assim que, em 1933, ele encontrou o imóvel perfeito no distrito de Ciutat Vella, que décadas depois se tornaria um local imprescindível na cidade. Ele o decorou tal como o El Floridita e, dois anos depois, sua filha María Dolores nasceu ali.

bar boadas
Conservado em sua estrutura original, o Boadas é conhecido em Barcelona não pelos Daiquiris, mas pelos Martinis

A RAINHA DOS COCKTAILS

Os frequentadores mais antigos do bar afirmam que a pequena María Dolores fazia sua lição de casa às voltas do bar durante o dia, para ficar próxima ao pai. Sua família englobava também a brigada comandada por Miguel, motivo de muita admiração. Como uma fruta não cai longe do pé, María Dolores se viu encantada pelo mundo do bar e da hospitalidade, e decidiu tomar rumo na profissão.

Esta não é Ada Coleman, mas María Dolores Boadas.

Ainda jovem, aprendeu os primeiros passos da coquetelaria com a ajuda do pai. O throwing foi aperfeiçoado com o tempo. Aos poucos, María Dolores foi se estabelecendo como a grande anfitriã da casa, sempre muito simpática, sorridente e acolhedora. Um segredo: uma famosa foto que circula na internet identificada como sendo Ada Coleman preparando um cocktail no Savoy, na verdade, retrata María Dolores atrás do balcão do Boadas.

Simpática, sorridente e acolhedora, María Dolores foi surpreendida pela morte do pai em 1967. Na época, tinha pouco mais de 30 anos e precisou passar de bartender à gestora e chefe de bar. Ela teve de colocar em prática muito do que aprendera com o pai, pegando as coqueteleiras e dando sequência ao trabalho impecável que transformou o Boadas em um dos principais pontos de encontro da capital.

O throwing aprendido na juventude fazia parte da identidade do bar. Trazido à Espanha por Miguel Boadas, era pouco conhecido e realizado na Europa até a década de 60. Não se tratava de mero mise en scene, como se provaria anos depois.

Por meio século, ela se manteve à frente da equipe de bartenders, preparando cocktails e sendo a verdadeira alma do Boadas. Neste período, serviu grandes personalidades, como o pintores Joan Miró e Salvador Dalí, o poeta Federico García Lorca, a atriz sueca Greta Garbo, o jornalista Manuel Vázquez Montalbán, o ator Kevin Costner, entre muitos outros. Símbolo máximo da paixão por Daiquiris, o escritor Ernest Hemingway também frequentou a barra de María Dolores. De tão assíduo que era no El Floridita, ele ostenta até hoje uma estátua dentro do bar, em Cuba.

Capa do livro de María Dolores Boadas, publicado nos anos 90 (Foto: Reprodução)

Em 1990, depois de acumular décadas atrás do balcão, María Dolores Boadas decidiu escrever um livro para deixar a marca do Boadas na história da coquetelaria internacional. O ‘Los Cócteles de Boadas Cocktail Bar‘ é uma coletânea das principais receitas servidas na casa e que conquistaram admiradores por todo o país.

Frequentador do Boadas, o escritor Manuel Vázquez Montalbán escreveu no prólogo da obra: “Os cocktails são bebidas tão urbanas quanto os táxis e a ficção policial, os três suportes culturais que tornam a cidade tolerável. São iguarias urbanas, construções artificiais, poções que fazem companhia e ajudam a transformar o idiota Dr. Jekyll no animado Mr. Hyde. Alto ou baixo, o cocktail é a única droga pós-moderna aceitável, reunindo diferentes culturas do álcool e do calor a serviço da cultura do sabor.

UM LEGADO INESTIMÁVEL PARA A COQUETELARIA

María Dolores Boadas preparando um cocktail
María Dolores Boadas fazendo seu conhecido throwing

Vinda de uma época em que não existiam campeonatos ou prêmios e quando curtidas e visualizações não tinham significado para a construção de uma carreira na indústria, o legado de María Dolores Boadas estava em sua hospitalidade. É pela conversa franca, o sorriso e gentileza, e sobretudo a atenção ao lidar com centenas de clientes por mais de meio século, que ela é celebrada na coquetelaria.

É claro que não podemos deixar de lado seus cocktails, além do aperfeiçoamento da técnica de throwing e sua difusão entre os profissionais de bar do país. Se hoje a Espanha é um dos grandes centros da alta coquetelaria, muito deve-se ao pequeno balcão do Boadas.

Seu trabalho atrás da barra foi tão sólido que, apesar de precisar deixá-lo por problemas de saúde agravados pela idade avançada, treinou por anos a fio seu sucessor: o bartender Jerónimo Vaquero, por quem María Dolores nutria os cuidados e o carinho tal como fosse seu filho.

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