⍟ Siga a rota do Clube do Barman pelos mais cultuados speakeasies do mundo! Desta vez, buscamos em nossos vizinhos algumas dicas para quem não abre mão de visitar um “bar secreto” em suas andanças. E encontramos verdadeiras preciosidades.
Fonte inesgotável de boas histórias, o período da Proibição ou Lei Seca Norte-Americana ainda segue a inspirar bares de todo mundo com o conceito de speakeasy (bar secreto). Claro que hoje manter-se relativamente oculto é missão mais ingrata – e a maioria das casas nem preza tanto por isso, afinal, é preciso garantir a frequência e o fluxo de caixa. Mas ainda é possível encontrar bares surpreendentes, cuidadosamente pensados e, acima de tudo, que esbanjam competência nas coqueteleiras.
Na América do Sul não é diferente. Buenos Aires, Montevidéu, Santiago e Bogotá que o digam. Aqui estão alguns endereços em que esta tradição sobrevive e honra com louvor suas origens. Cada um, a sua maneira, adapta-se à modernidade, ao público e às tendências da coquetelaria atual.
É hora de conhecê-los:
FRANK’S BAR
Buenos Aires
O Frank’s Bar é o speakeasy mais cultuado de Buenos Aires. A começar pelo verdadeiro ritual que precede seu acesso, digno das raízes dos bares escondidos.
A porta de entrada não exibe nada além de uma pequena placa, que passa quase despercebida ao transeunte mais desavisado. E mesmo quem chega sabendo da existência do local, não tem por lá vida fácil. Prá começar, é preciso trazer na ponta da língua a senha da semana, divulgada por meio de pistas nas redes sociais.
Depois de passar pelo segurança com as palavras certas, ainda é necessário receber dele um código numérico, a ser digitado em uma cabine telefônica no fundo do corredor. O clima é de “abandono” – a única luz é a do letreiro de uma sex shop desativada.
Todo esforço, porém, é devidamente recompensado. O Frank’s capricha em todos os detalhes e justifica os prêmios recebidos da imprensa especializada . Os elegantes bartenders, em sua maioria crias de Seba Garcia, hoje no Presidente Bar, centralizam as atenções. Servem com eficiência clássicos e originais como o Treacle (rum, suco de maçã, bitters e limão), o Sazerac (bourbon, amêndoas, bitters, açúcar e limão) e o Bison TT (vodka, chá verde e xarope de gengibre).
A decoração e trilha sonora de época são outros diferenciais: o espaço flerta com os antigos salões de baile, acomodando lustres imponentes, poltronas de veludo vermelho e bancada toda em madeira de lei, além de um sugestivo retrato de Al Capone. Nas caixas de som, jazz, soul e R&B. E quem experimenta o cardápio, garante: a gastronomia acompanha a excelência dos coquetéis.
Calle Arévalo 1445, Palermo. Buenos Aires (ARG)
BARÓN – LA BARBERÍA
Montevidéu
A barbearia funciona normalmente até às nove da noite. A partir daí, no mesmo endereço, entra em cena um dos bares mais comentados da noite de Montevidéu.
O acesso à barra, para não fugir à regra, é engenhoso. O próprio barbeiro faz as vezes de segurança e se encarrega de abordar os clientes que começam a chegar, não para cortar o cabelo, mas dispostos a degustar saborosos coquetéis. É preciso ter a senha para se aproximar do lavabo, uma parede de azulejos brancos que, na verdade, é a porta do salão.
Lá dentro se revelam dois pisos servidos por um único bar, de grande porte, onde se destacam centenas de garrafas, mesas de madeira rústica e pôsteres de época.
A carta de coquetéis da casa está dividida em três grandes famílias. A do Negroni tem seis variações, entre elas o Negroni Añejado (whisky, vermute branco, vermute italiano e vermute carpano). A dos clássicos traz receitas da época da Lei Seca, como o Mint Julep (suco de lima, xarope simples, Jameson e hortelã). E a Coctelería del Barón, autoral, que reúne criações como Asesinato em la Cava (Absolut Blackberry, redução de frutas vermelhas, suco de lima e xarope simples) e El Amante de Carlota (vermute italiano, bitter de laranja, suco de lima, suco de pomelo, clara de ovo e angostura).
O proprietário, Alfredo Benítez, conta que há algum tempo vinha observando a tendência das barbearias em retomar o estilo clássico e viu ali havia um elo com a tradição dos speakeasies. “Me encantava a ideia de ter os dois estabelecimentos funcionando simultaneamente. Assim que encontrei o local, tomei a decisão muito rápido“, revelou, em entrevista recente à imprensa uruguaia.
Calle Santiago de Chile 1270, Centro. Montevidéu (URU)
THE 86
Bogotá
O bar fica no piso superior do restaurante asiático Thom Ngon. Ao final das escadas, há uma campainha e lá deve-se esperar até que uma pequena portinhola se abra. Como o local não aceita reservas, é bom contar com a sorte.
À boca pequena, diz-se pelos arredores que os proprietários costumam prezar pelos que realmente se interessam pela alta coquetelaria – e não aqueles que somente procuram o bar pelo desafio de burlar seu status secreto.
Por tudo isso, nota-se que um speakeasy extremamente tradicional. O blues e o jazz old school brindam os ouvidos mais atentos e as excentricidades incluem até luzes vermelhas acionadas por correntes, que chamam o serviço à mesa.
Mas a grande atração é mesmo a carta de coquetéis, inventiva e desafiadora. São criações em que predominam bases infusionadas de rum, tequila, uísque e licor, além de insumos que vão desde frutas típicas, como a curuba, até cogumelos. O Ay Guey!, por exemplo, combina espuma de manga verde, pisco de gengibre e mezcal defumado. Da escola Tiki, o J Bird conta com especiarias da casa para personalizar a mistura de rum, suco de abacaxi, suco de limão, xarope simples e vermute italiano.
Refrescantes, fortes e saborosos, os coquetéis costumam receber elogios, assim como o atendimento dos bartenders, que ficam em uma bancada no centro do salão e não economizam na performance durante o preparo das bebidas.
Calle 69-A # 10-05, Quinta de Camacho. Bogotá (COL)
DR JEKYLL
Santiago
Outro bar que utiliza o patamar superior de um restaurante, o Dr. Jekyll é o anexo do tailandês Ky. Aliás, o próprio endereço principal sustenta ares de speakeasy. Embora já bastante procurado na capital chilena, permanece sem nenhuma sinalização na fachada, que mais parece uma construção abandonada.
A casa é indicada para quem pretende não só saborear um bom coquetel, mas também vivenciar uma experiência mais interativa e teatral. Trata-se de um autêntico “laboratório” inspirado na consagrada novela do autor escocês Robert Louis Stevenson (The Strange Case of Dr. Jekyll e Mr. Hyde), cujo filme homônimo, de 1941, é mais conhecido no Brasil como O Médico e o Monstro.
A proposta é levada tão a sério que o balcão tem tubos de ensaio para o preparo de drinks especiais. Até o bartender, Ronaldo Martinez, entra no clima: ele interpreta o personagem, com direito à avental branco e caracterização de época.
Frequentadores da casa costumam listar o Rozameltini (pisco, limão galego e suco de mirtilos frescos) e o Mirotini (pisco, licor de laranja, maracujá e suco de framboesa) entre os preferidos. Mas é bom estar atento: o Dr. Jekyll não tem horários fixos e costuma convocar os clientes somente pelas redes sociais, horas antes de abrir, divulgando senhas que permitem a entrada.
