⍟Nomes de peso da coquetelaria mineira na atualidade, Thiago Ceccotti, Tiago Santos e Thiago Che Gazzinelli não têm apenas o nome e a profissão em comum. Também são unânimes em reconhecer que há muitos desafios a serem superados para que o setor se consolide na região.
Publicado em 1 de junho de 2016, às 18h.
Qual o caminho mais recompensador para um barman? Abrir o próprio bar, uma empresa de consultoria ou deixar tudo para trás e viver uma vida mais simples, à beira da praia?
Quem sugere a discussão para abrir a conversa é Thiago Che Gazzinelli, do alto de seus 14 anos de carreira, boa parte deles vivenciados em balcões da capital mineira. O tema é universal, claro, mas inegavelmente ganha contornos particulares em se tratando da agitada Belô – um mercado de grande potencial e em notória expansão, mas onde profissionais de bar ainda buscam se ajustar à equação ‘quantidade x qualidade’ diante da crescente demanda.
“Metas foram atingidas, bares abriram e fecharam suas portas, diversos profissionais foram formados e clientes entenderam o que é um coquetel de qualidade”.
Thiago Che Gazzinelli, sobre a coquetelaria em Belo Horizonte o sucesso alcançado pela empresa Rocktails
Com passagens por bares da costa oeste norte-americana e várias capitais brasileiras, Che – apelido que carrega desde os tempos de uma tarefa de escola, quando interpretou o mentor da revolução cubana – é taxativo ao analisar a coquetelaria local. Admite o aumento do consumo de drinks nos últimos cinco anos, mas defende a necessidade de mais investimento na chamada “cultura de balcão”:
“Diferente de outras capitais, a maioria dos bares de Belo Horizonte não oferece espaço para que o cliente sente-se no balcão. Os coquetéis são geralmente comandados pelos garçons, daí nota-se o distanciamento entre o bartender e a clientela”, aponta.
Sua contribuição para reverter esse quadro em parte tem sido dada pela Rocktails, empresa que fundou em 2012 com Felipe Brasil, disposto a oferecer o know-how acumulado no ramo como alternativa ao que define como ‘falta de referência’ dos empresários.
Perguntado sobre a eficiência da empreitada até aqui, ele mantém o tom incisivo: “Metas foram atingidas, bares abriram e fecharam suas portas, diversos profissionais foram formados e clientes entenderam o que é um coquetel de qualidade”.
The Lighthouse
(Thiago Che Gazzinelli)
INGREDIENTES
45 ml de Beefeater Gin
25 ml de Pisco 22,5 ml de syrup de mel
25 ml de suco de limão 4 gotas de Angostura Bitters
1 twist de limão siciliano
MODO DE PREPARO
Bater os ingredientes e servir num copo Old Fashioned com gelo até a borda. Servido com um twist de limão siciliano
FAZENDO A DIFERENÇA
O ano de 2012 também foi marcante para Thiago Ceccotti. Formado em matemática computacional, ele resolveu abrir mão dos números para se dedicar às coqueteleiras, influenciado principalmente pelo trabalho de grandes nomes do cenário internacional, como Jeffrey Morgenthaler, Darcy O’Neill e Jamie Boudreau.
“Aqui existe uma lacuna entre a alta coquetelaria e a básica, que necessita ser preenchida, tanto da parte dos clientes como dos novos profissionais”
Thiago Ceccotti
Embora há menos tempo na estrada, ele já demonstra segurança sobre como pretende fazer a diferença no mercado: “Aqui existe uma lacuna entre a alta coquetelaria e a básica, que necessita ser preenchida, tanto da parte dos clientes como dos novos profissionais”, atesta.
A carta de drinks que desenvolveu para o DUB, do qual é sócio, mostra uma de suas tentativas em aproximar os dois extremos: “Primeiro removi coquetéis muito semelhantes entre si e depois busquei novas ideias, visando atingir tanto o público da casa que já consome coquetéis quanto àqueles que habitualmente prefeririam um vinho ou uma cerveja”, conta.
A iniciativa de Gazzinelli e Felipe Brasil, sócios a frente da Rocktails, é uma resposta à necessidade de valorização da coquetelaria e aproximação do profissional com o público
Em paralelo, Ceccotti também dirige uma empresa de consultoria, a Ducktails, que tem como meta implantar a coquetelaria de qualidade em restaurantes já conhecidos pela excelência gastronômica. Esta transição para o empreendedorismo, em sua opinião, é algo natural no contexto atual da profissão. “Atualmente, muitos dos bartenders que prosperam já estudaram algo sobre gestão, administração e finanças. Para transitar para a vida empresarial é necessário muito estudo e contatos em áreas fora do mundo do bar”, defende.
Colonial Highball
(Thiago Ceccoti)
INGREDIENTES
50 ml de cachaça Janeiro
50 ml de suco de limão
25 ml de licor de jabuticaba
1 bailarina de geleia de jabuticaba
50 ml de água gaseificada
1 fatia de limão
MODO DE PREPARO
Dissolver a geleia na cachaça, adicionar os ingredientes à coqueteleira e bater. Servir em copo longo com gelo novo e completar com água gaseificada. Enfeitar com uma fatia de limão.
ADMINISTRADOR DE BAR
Tiago Santos, no mercado desde 2006, adota a mesma linha de pensamento. Por isso, costuma se definir não mais como bartender, nem como mixologista. “Por entender uma necessidade de mercado, me considero hoje um administrador de bar. Faço a engrenagem rodar e busco o retorno financeiro”.
“Por entender uma necessidade de mercado, me considero hoje um administrador de bar. Faço a engrenagem rodar e busco o retorno financeeiro”.
Tiago Santos
Em sua opinião, é fundamental ter estratégias definidas para todas as situações, desde o que servir no balcão até quais contratos devem ser assinados. Como exemplo, ele cita a transformação do Restaurante do Ano em uma das referências pioneiras da coquetelaria na Grande BH: “Chegamos a ter 170 receitas.
Fui criticado, mas isso só nos fortaleceu, tanto que hoje o cenário (da coquetelaria) aqui é outro”, comenta.
Sua criação mais recente é a nova carta da casa de shows Gilboa, cujo bar está sob sua direção.Após analisar e perceber a presença majoritária do público feminino, e consequentemente, da preferência por receitas mais adocicadas, ele resolveu arriscar. Apostou na mudança de dosagens e ingredientes para “demarcar o território do amargo”.
E vem colhendo bons resultados, com os novos drinks fi gurando há alguns meses na lista do mais vendido. “Sempre que se investe em conscientização do consumidor, ele fi ca mais exigente e curioso”, acrescenta Thiago Ceccotti. Ele observa esta tendência entre seus atuais clientes e a encara como estímulo.
De fato. E com tantos desafios na pauta belo-horizontina, seria impossível encerrar a conversa sem cobrar de Che Gazzinelli uma resposta à pergunta formulada no início.
E ele não hesita. Com a espirituosidade típica de seus conterrâneos, abre mão de escolher dentre as alternativas que citou para deixar no ar uma reflexão bem mais subjetiva: “Nossa profissão é recompensadora, sim, mas na medida em que as nossas expectativas forem alcançadas”.
A Bela e a Fera
(Tiago Santos)
INGREDIENTES
60 ml de Absolut Vodka
10 ml de aperitivo italiano
10 ml de suco de limão
70 ml de pêra
8 morangos
20 ml de Grenadine
MODO DE PREPARO
Macerar os morangos na coqueteleira, colocar todos os ingredientes e misturar. Fazer dupla coagem e servir numa taça de vinho com gelo.
Ping Pong
Simples assim, uai! antes de encerrar a entrevista, pedimos ao trio que respondesse perguntas idênticas sobre mercado e pesquisa. Confira:
Quais características buscam ao montar sua equipe?
Thiago Ceccotti: Partindo do princípio de que qualquer pessoa pode fazer excelentes coquetéis, as qualidades que procuro em um profissional de bar são principalmente carisma, compromisso e vontade de aprender e reaprender sempre. E um sorriso inabalável.
Tiago Santos: Disposição para valorizar os coquetéis e uma boa conversa, humildade… Autenticidade também, pois é válida a inspiração em outro profissional no início, mas após algum tempo é preciso seguir a própria linha. E, acima de
tudo, ser proativo. Este é o primeiro fator que levo em consideração.
Thiago Che Gazzinelli: No passado eram as de praxe: vontade de aprender,
comprometimento, apresentação pessoal, etc. Hoje ofereço um emprego, uma oportunidade para quem precisa trabalhar e sustentar sua família. Quem precisa
de emprego é honesto, pontual e responsável. É o que busco.
Qual a influência da culinária mineira em seu trabalho?
Thiago Ceccotti: É através das emoções culinárias que eu busco despertar o interesse dosclientes. Produtos locais como chá de abacaxi, geleias e doces típicos do interior de Minas e frutas do cerrado representam muito bem minha coquetelaria.
Combinações de sabores locais também ajudam a criar uma conexão entre o convidado e o coquetel.
Tiago Santos: Por mais que eu queira utilizar os produtos regionais, ainda acho que os próprios mineiros não se acostumaram tanto à ideia de vê-los no copo. Atento ao que acontece no mercado, procuro dar um passo de cada vez. Mas faço alguns coquetéis com cachaça, já uso um pouco de piquí, paçoca e outros ingredientes.
Thiago Che Gazzinelli: A gastronomia mineira é inspiradora quando você está ao pé de um fogão à lenha, aprendendo com diversas gerações de pessoas que mantém suas tradições culinárias, produção de insumos e cultivo de produtos. Essa é a melhor harmonização. E o que mais me influencia é o amor que essas pessoas colocam no processo.