⍟ Ervas, frutas e especiarias são capazes de transformar um álcool neutro em uma bebida rica em sabores e complexidades. Descubra as origens do uso de botânicos no gin e a composição dos principais rótulos do destilado
O gin é conhecido e famoso, mundialmente, por seus botânicos. São eles que acrescentam sabor e aroma ao spirit, abrindo as portas para um mundo de possibilidades de combinações e receitas. Por definição, o gin é um destilado geralmente neutro, que depois é redestilado com zimbro e uma seleção de botânicos, que podem ser desde frutas até ervas e especiarias diversas. Cada marca e produtor escolhe os botânicos necessários para que cada rótulo tenha um perfil distinto de sabor.
Não existe uma regra muito definida a respeito de quantos ou quais botânicos, além do zimbro, um gin deve levar em sua receita e nem seu formato. O botânico pode ser adicionado in natura, extraindo sabor e aroma, essência, transmitindo à bebida apenas aroma, ou extrato, adicionando apenas sabor, e isto é o que torna cada marca única.
Mas o que são, exatamente, esses botânicos? Como eles fazem parte da produção da bebida e por que é preciso conhecê-los? Para responder essas perguntas, convidamos você a fazer um passeio até as origens da bebida.
UM POUQUINHO DE HISTÓRIA
Embora nós associemos quase imediatamente o gin ao Reino Unido, como bebida-símbolo da Inglaterra e de sua realeza, ela não nasceu neste país, mas em outro, a centenas de quilômetros. A verdade é que o gin teve uma bebida precursora, o genever, criado na Holanda no século XVI como um produto para tratar problemas renais. A palavra ‘genever‘ significa zimbro em holandês, pequenas frutas europeias que eram incorporadas ao vinho de malte ou álcool neutro produzido no país.
No século seguinte, os médicos atestaram que a bebida não tinha verdadeiros benefícios medicinais que justificassem sua indicação, tornando-a, portanto, uma bebida alcoólica comum. Ela começou a ser amplamente consumida pelo baixo preço de custo e o sabor agradável, herbáceo e fresco, próprio do zimbro.
Foi durante a Guerra dos Trinta Anos (1618 – 1648), em que holandeses e ingleses lutaram lado a lado por motivações religiosas e políticas, que os ingleses tiveram o primeiro contato com a bebida. Eles admiravam a coragem dos soldados holandeses durante os combates que, seguramente, eram precedidos de boas doses de genever. De volta para casa, os soldados ingleses espalharam a notícia sobre o destilado e não demorou para que os holandeses começassem a comercializá-lo em todo o mundo em sua vasta frota de navios mercantes.
O gin se tornou uma bebida tão saborosa, barata e palatável que gerou, nos séculos XVII e XVIII, uma verdadeira crise social no Reino Unido, chamada de Gin Craze. Conheça mais sobre a história nesta matéria:
Gin Craze: A loucura do gin na Inglaterra dos séculos XVII e XVIII
REDESTILAÇÃO
Após a produção do destilado, muitas vezes neutro (que pode ter origem cereal ou ainda de tubérculos, como é o caso da batata), é preciso fazer com que as propriedades dos botânicos sejam incorporadas à bebida. Isso é feito a partir da maceração dos produtos em álcool e de sua posterior redestilação, que vai assegurar os aromas e sabores em um gin limpo e equilibrado.
Vamos tomar como base o processo de produção de Beefeater Gin. O master distiller da marca, Desmond Payne, escolhe pessoalmente os botânicos frescos que depois são adicionados ao álcool de concentração média (cerca de 50%). Eles passam por uma rigorosa análise de qualidade antes de serem colocados no alambique, a fim de manter as mesmas características da receita original de James Burrough, criada há três séculos. Antes que a mistura seja aquecida e redestilada nos alambiques da destilaria, todos os botânicos passam por um processo de maceração durante 24 horas, com o propósito de extrair ainda mais o caráter de seus ingredientes para o álcool.
Além da maceração tradicional, existem outros métodos de redestilação na indústria do gin, usados em menor escada. Entre eles, a infusão a vapor (em que botânicos e álcool não entram em contato direto), retificação alcoólica, destilação à vácuo, etc. Vale destacar também que há alguns rótulos de gin que recebem a adição de essências dos botânicos, como é o caso de Orloff Gin, e não passam por uma nova destilação.
PAIRINGS DE SABOR
A depender dos botânicos utilizados na produção de um determinado gin, é possível criar cocktails que destaquem determinadas notas de sabor ou aroma presentes em seus botânicos originais.
Vamos voltar ao exemplo de Beefeater Gin, seu rótulo mais famoso leva nove botânicos em sua composição, que conferem notas de sabor sutis de forma equilibrada, isto é, todas as características destes ingredientes podem ser percebidas pelos paladares mais treinados. Mais do que a percepção individual destes sabores, a combinação dos botânicos serve para que todos esses sabores trabalhem em conjunto, dando a personalidade ao gin e ressaltando algumas de suas características de forma dominante.
Você quer saber mais sobre como identificar as características dos botânicos de um gin e criar drinks que valorizem sua composição? Falamos mais a fundo sobre o tema nesta matéria especial do reality show Bar Aberto:
Episódio 2 – Conhecendo o gin para preparar o G&T e o drink autoral perfeitos
PRINCIPAIS BOTÂNICOS UTILIZADOS NA INDÚSTRIA
Chegou a hora de arregaçar as mangas e conhecer os principais botânicos utilizados na produção do gin. É claro que o zimbro está entre eles, porém, vale a pena conhecer os outros ingredientes, que podem variar entre raízes, sementes, temperos, ervas e até mesmo frutas. Com a modernização da indústria e do paladar dos consumidores, algumas marcas dão um passo adiante e incorporam novos botânicos às suas receitas, fazendo com que esta lista esteja em frequente expansão.
ZIMBRO – É o principal ingrediente de qualquer gin. O zimbro tem sabor amargo, picante e levemente frutado ou adocicado. As bagas podem ser colhidas em países como a Macedônia, Itália e Índia.
SEMENTE DE COENTRO – Proveniente da Europa oriental e países como Marrocos, Romênia e até mesmo a Rússia. A utilização do seu óleo essencial, o linaol, adiciona notas frescas de gengibre, sálvia e limão à bebida.
CASCA DE LIMÃO – Adiciona um perfil cítrico nítido e preciso para o gin. Utiliza-se a casca ao invés da fruta inteira pois é nela que encontramos a maior disponibilidade de óleos essenciais. Grande parte das cascas de limão utilizadas na indústria vem da Espanha, assim como no caso das laranjas.
CASCA DE LARANJA – Laranjas de Sevilha são utilizadas principalmente na produção de Beefeater Gin e ajudam a adicionar um sabor cítrico e amargo à mistura. Porém, a origem da fruta pode variar de acordo com o produtor e as características desejadas para a bebida.
RAIZ DE ALCAÇUZ – Amadeirada, amarga, muito doce, terrosa de sabor semelhante ao do anis, com um sabor residual duradouro, amargo e salgado. Para ser utilizada no gin, a raiz firme do alcaçuz precisa ser moída. Este botânico, além de ser refrescante, também é responsável por arredondar o sabor da bebida.
NOZ MOSCADA – Com origem no oriente, a noz moscada é utilizada na produção de gin para conferir notas quentes, doces e aromáticas.
LAVANDA – Seu óleo essencial é um dos mais populares da indústria farmacêutica. Porém, mais recentemente, passou a ser incorporado ao gin para trazer notas leves e florais, principalmente nas bebidas produzidas nos Estados Unidos.
PIMENTA – Algumas variedades de pimenta são utilizadas em forma de sementes na produção de gin, entre elas a pimenta do reino. De forma geral, trazem notas picantes e frescas à bebida.
CARDAMOMO – Encontrado com abundância na Índia, o Cardamomo tem um aroma e sabor bastante marcante. No gin, ele adiciona complexidade por meio de notas cítricas e picantes, lembrando vagamente o eucalipto.
CANELA – Proveniente do Sri Lanka, a canela é obtida por meio da retirada de pedaços do tronco de uma árvore comum em países como a China e o Vietnã. No gin, trazem notas picantes e adocicadas.
AMÊNDOAS – Traz um leve toque de marzipan, toffee e especiarias.
PEPINO – Quando introduzido na produção do gin, o pepino confere um sabor marcante para a bebida.
CÁSSIA – Da mesma família da canela, tem sabor mais adocicado e também pode ser utilizada na produção da bebida.
RAIZ DE LÍRIO – Confere ao gin notas aromáticas, florais e levemente terrosas, com um toque de violeta de Parma.
RAIZ DE ANGÉLICA – Proveniente principalmente da Bélgica, a raiz de angélica adiciona notas amadeiradas, de especiarias e sabores equilibrados ao gin.
SEMENTE DE ANGÉLICA – Proveniente da Bélgica. Perfumada, semelhante ao lúpulo com notas florais.