⍟ Aclamado por uns, odiado por outros, o Ramos Gin Fizz é um drink com mais de 130 anos de trajetória que nos convida a uma viagem pelos bares de Nova Orleans
A lista de ingredientes é extensa, e o preparo, longo. Mas todos os sacrifícios valem a pena quando é hora de beber um cocktail histórico e saboroso, como é o caso do Ramos Gin Fizz. Sua criação, que data de 1888 (sim, quase no mesmo ano da Proclamação da República no Brasil), nos leva de volta às noites boêmias de Nova Orleans, um dos grandes centros da coquetelaria norte americana marcado por outras obras-primas etílicas, como o bom e velho Sazerac.
Por lá, cada esquina representava uma nova oportunidade de conhecer os sabores da cidade, conversar com pessoas interessantes e apreciar boas músicas. Foi justamente neste contexto, de grande número de turistas, visitantes e paladares diversos que o bartender Henry Charles Ramos (ou Carl Ramos) criou o Ramos Gin Fizz – na época chamado apenas de The New Orleans Fizz.
O cocktail com sua espuma volumosa e aerada chamava atenção do público que logo caiu nas suas graças – tornando a receita autoral de Ramos, que ele chamava de ‘My One and Only‘, uma grande sensação entre os visitantes.
SHAKE, SHAKE, SHAKE
Não escrevemos a palavra ‘shake‘ tantas vezes por engano, mas porque essa é a parte mais importante da produção do cocktail. Imagine: se alguns bartenders não suportam o Ramos Gin Fizz preparando um ou dois por noite, o que seria dos braços deles se preparassem dezenas todos os dias?
Fato é que a popularização do Ramos Gin Fizz tornou necessário o ajuste da brigada de bar a níveis nunca antes vistos. Em épocas de alta temporada turística, com sol e calor, cerca de 20 bartenders ocupavam o espaço atrás da barra com braços chacoalhando coqueteleiras geladas incessantemente. E mesmo assim, era comum não darem conta da demanda.
Afinal, segundo H. C. Ramos, era necessário fazer shakes de até 15 minutos para conseguir a espuma perfeita, cremosa e saborosa que era a marca registrada da sua receita autoral. Além de cansativo para preparar, os ‘shaker boys‘ precisavam segurar as coqueteleiras com panos, já que chegavam a ficar opacas de tão geladas.
Graças a mais de uma década de prática, hoje já podemos respirar aliviados, pois não é necessário agitar a mistura por mais do que 50 segundos no total.
SUCESSO
Com o sucesso absoluto de sua criação, que na época era preparada com Old Tom Gin, H. C. Ramos conseguiu realizar o sonho de abrir o seu próprio bar na Gravier Street, batizado de Stag Saloon. Por lá, o movimento durante o Carnaval e o Mardi Gras tornava necessário duplicar o número de pessoas na barra – e mesmo assim parecia não ser o suficiente.
Além dos turistas e moradores da cidade, outra pessoa ajudou na popularização deste cocktail icônico: o governador do estado da Louisiana, Huey P. Long. Ele era um grande entusiasta da receita e levava bartenders consigo em suas viagens pelo país para que pudesse tomar o Ramos Gin Fizz onde estivesse.
OK, MAS E A LEI SECA?
Poucos anos após abrir o próprio bar, em 1907, a Lei Seca foi promulgada nos Estados Unidos, arrastando para a ilegalidade grandes gênios da coquetelaria, como H. C. Ramos. No dia 27 de outubro de 1919, quando o relógio do bar marcou a meia-noite, ele anunciou à clientela que havia vendido o seu último Ramos Gin Fizz – ou como gostava de chamar seu ‘Primeiro e Único’.
A receita criada por ele foi mantida sob sigilo até o dia em que um repórter do jornal The New Orleans Tribune decidiu entrevistá-lo para saber mais sobre a criação, que não mais era servida por ele nas ruas da cidade. O segredo, revelado por ele, foi publicado no jornal em 23 de setembro de 1928, cinco dias após a morte do bartender, sob o título “Uma homenagem a um dos maiores tesouros de Nova Orleans”.
Com a morte de Ramos e o fim da Lei Seca, chegava a hora do Ramos Gin Fizz retomar o seu lugar sob os holofotes. Em 1935, o filho de Ramos decidiu vender os direitos autorais da receita para o Fairmont Hotel, localizado a poucas quadras do endereço original do bar, que continua a vendê-lo após quase cem anos.
Para saber mais sobre a Lei Seca que suspendeu a venda legalizada de álcool nos Estados Unidos, confira esta matéria completa:
MACETES PARA O RAMOS GIN FIZZ
Pesadelo para muitos bartenders iniciantes, o Ramos Gin Fizz é um cocktail que requer atenção e cuidados em todas as etapas de produção. O shake e a espuma são cruciais para a boa execução da receita e, em caso de qualquer erro, é preciso começar outra vez. Por isso, por mais que a casa esteja cheia, não se apresse (lembre-se da quantidade de bartenders que o Henry C. Ramos precisava para manter sua produção em alta).
Para conseguir uma espuma mais densa, volumosa e consistente, característica mais popular da receita, é preciso fazer dois tipos de shakes diferentes. O primeiro é o dry shake, realizado com todos os ingredientes, porém sem gelo. A ideia aí é emulsificar todos os insumos para facilitar a formação da espuma. Em seguida, basta abrir a coqueteleira, adicionar cubos de gelo e retomar o shake por algo em torno de dez a 15 segundos (parece muito tempo, mas a gente promete que vale a pena).
Na hora de finalizar o cocktail, lembre-se de completar o copo com a club soda lentamente, por apenas um dos lados, a fim de manter a carbonatação da bebida e ajudar a elevar a espuma até a superfície do copo.
Usar a clara de ovo in natura para a produção da espuma não é a escolha mais simples e segura para a saúde dos clientes. Na matéria abaixo, você descobre algumas alternativas ao ingrediente:
Agora que você já conhece o passado do drink e as principais dicas para executá-lo corretamente, confira abaixo a receita completa:
Ramos Gin Fizz
INGREDIENTES
50 ml de Beefeater London Dry Gin
10 ml de suco de limão siciliano
10 ml de suco de limão tahiti
15 ml de simple syrup
5 ml de água de flor de laranjeira
3 dashes de extrato de baunilha
20 ml de clara de ovo pasteurizada
20 ml de creme de leite
50 ml de club soda
MODO DE PREPARO
Adicione todos os ingredientes (com exceção da club soda) a uma coqueteleira sem gelo e agite por dez segundos. Em seguida, adicione gelo e repita o shake. Faça uma coagem para um copo alto resfriado previamente e complete com a club soda até que a espuma ultrapasse a borda do copo. Guarneça com um zest de limão siciliano.
Agora que você já sabe a história por trás do Ramos Gin Fizz, confira algumas curiosidades da Caipirinha, nosso patrimônio nacional:
Caipirinha: as possíveis origens do clássico brasileiro centenário