Como criar espuma para seu drink sem ovos – Parte II

⍟ Recentemente abordamos a produção de drinks com espuma sem a utilização de claras de ovo. Como o interesse de nossos leitores pelo assunto é grande, nos apressamos em dar continuidade ao tema. Confira agora a segunda parte desta matéria especial.

Diversos insumos podem ser utilizados para produzir espuma em drinks, além da clara de ovo. Como vimos anteriormente, algumas frutas, como abacaxi e melão e caldo de cana; bebidas carbonatadas, como refrigerantes e tônicas podem proporcionar espumamento da bebida se utilizados corretamente. Ademais, é possível fazer uso de outros, tão ou mais capazes de produzir o efeito desejado que o ovo produz.

A edição 28 da Revista Clube do Barman alertou sobre o uso de claras de ovo cruas. À época, a solução apresentada foi o emprego da clara pasteurizada

Em sua versão impressa, a Revista Clube do Barman tratou do uso de clara de ovo pasteurizada para a produção de coquetéis com espuma como alternativa à utilização da clara crua in natura. A matéria pode ser lida aqui. Tal opção se deu pela proibição de utilização de ovos crus por parte de estabelecimentos comerciais. De acordo com a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), em sua resolução de número 35, de 17 de junho de 2009, diversos casos de intoxicação pela bactéria salmonela haviam sido registrados em anos anteriores.

Já em 2009, a Anvisa emitiu um alerta sobre os crescentes casos de salmonela devido ao consumo de ovos crus ou mal cozidos. Soluções para o problema não tardaram em aparecer

A Anvisa definia, então, que todas as marcas de ovos deveriam adequar suas embalagens, de modo a informar que seu consumo sem cozimento oferecia risco de contaminação pela bactéria. A medida educativa foi recebida com bastante seriedade pelos donos de estabelecimento e hoje vemos uma adequação à realidade imposta. Usar ou não ovo cru em determinadas receitas deixava de ser uma questão de gosto particular e passava a ser um caso de saúde pública.

Não tardaram a surgir soluções para o problema de contaminação. Um deles é a aplicação do processo de pasteurização aos ovos, que consiste em causar um choque térmico no alimento a fim de eliminar qualquer resquício de contaminação. Mesmo parecendo uma solução definitiva, esta prática também não demorou a se mostrar uma maneira contraproducente de resolver o problema. Alguns profissionais de bar afirmam que, mesmo os insumos pasteurizados tem seus pontos negativos.

“É virtualmente impossível evitar que o ovo engarrafado se estrague e isto torna a contaminação iminente”

-Thiago Crimson

Segundo o barman Thiago Crimson, atualmente realizando consultoria no Armazém São Caetano, o emprego das claras pasteurizadas pode ser até mais perigoso do que o do ovo in natura. “A clara pasteurizada é vendida em garrafas. A menos que seja usada um bar de altíssima frequência, onde o conteúdo da garrafa possa ser consumido rapidamente, é virtualmente impossível evitar que o ovo engarrafado se estrague e isto torna a contaminação iminente”.

Ele explica que, após a abertura da garrafa, a clara volta a estar sujeita a bactérias e outras doenças. O processo de pasteurização elimina a possibilidade de contaminação anterior ao envase, mas não previne as contaminações futuras. Sua durabilidade é relativamente maior que o da in natura.

Contudo, após alguns dias, é preferível não arriscar. “Ou você descarta aquele produto ou corre o risco de fazer um cliente adoecer”, afirma Crimson.

ESPUMA COM REDUÇÃO DE GRÃO DE BICO

O drink Singani Sour, de Thiago Crimson, com a espuma produzida a partir de redução de água de cozimento de grão de bico, ou aquafaba

Quando perguntado sobre como tem feito espuma nos drinks, ele dá uma de suas receitas: “Já há alguns anos, tenho trocado as claras de ovos por outros ingredientes, como sucos, fermentados e a aquafaba, que é uma redução de água de grão de bico com um toque de lecitina de soja”. A lecitina de soja pode ser comprada facilmente em drogarias e lojas de produtos naturais. Também pela internet é possível adquirir o produto, que, além de fazer uma boa espuma, também traz alguns benefícios para a saúde. O substrato de soja tem propriedades que protegem o cérebro e o sistema cardiovascular, ajudando a reduzir os níveis de colesterol no sangue. Uma troca aparentemente bastante razoável, considerando a ameaça de salmonela presente no ingrediente original viagra comparatif.

Para fazer a redução, também chamada de ‘aquafaba’, basta aquecer água de cozimento de grão de bico que ficou de molho de um dia para o outro. Esquente a água em uma panela até que seu volume reduza pela metade e o caldo se torne mais denso. Desligue o fogo e coloque 1/5 da redução em um liquidificador com um pouco de lecitina de soja (na proporção de 1/1000 do volume total da redução). Bata no liquidificador apenas o suficiente para que a lecitina se misture ao líquido morno, então retorne a mistura para o restante do líquido na panela mexa para que se dissolva.

Em seguida guarde em uma pequena garrafa. Esta redução não tem prazo de validade indeterminado, mas pode durar mais que uma garrafa de clara pasteurizada se armazenada corretamente sob refrigeração. Além disso, os componentes da redução não favorecem a proliferação de bactérias. Thiago também dá outra dica: “dependendo da receita, uso até mesmo cerveja de trigo, que também dá uma excelente textura ao drink“.

ESPUMA COM LECITINA DE SOJA

Um exemplo de air feito com lecitina de soja, no drink Fresh Hot, por Bruno Mendes Caldeira

Segundo o bartender Bruno Caldeira Mendes, especializado em mixologia molecular, é possível escolher entre a lecitina e a albumina quando a intenção é criar espuma. A preferência por uma ou por outra depende do resultado final esperado. “A lecitina dá o efeito de ar, bastante usado na mixologia molecular. Fica igual ao da espuma que se forma quando batemos o suco de abacaxi no liquidificador. Já a albumina tem o efeito similar ao da clara de ovo. Em bares de grande giro, tem se tornado comum a sua utilização”.

ATENÇÃO NA QUALIDADE E NO PREPARO

Ainda segundo ele, deve-se atentar à proveniência da lecitina utilizada para a confecção de espuma. Se ela for de baixa qualidade, pode alterar o sabor e a textura do drink, conferindo amargor e sensação de arenosidade no paladar. Quando é utilizada fora de um excipiente, como no caso da redução de grão de bico, ele desaconselha a agitação na coqueteleira para a emulsificação da espuma. E ainda dá um conselho para melhor aproveitamento de suas propriedades: “É bom utilizar um mixer ou outro equipamento que faça o ar com a força de um motor”.

ESPUMA COM ALBUMINA

A espuma do Virga Pepper Sour, de Stephanie Marinkovic, feita com albumina

A bartender Stephanie Marinkovic usa bastante a albumina em suas criações. Ela, inclusive, substituiu a clara de ovo nas receitas com sour. Perguntada se nota diferença entre uma bebida feita com clara e outra feita com albumina, é taxativa: “Noto sim, o coquetel fica muito melhor e mais cremoso”.

Após fazer diversos testes, entre clara de ovo, lecitina e albumina, ela acredita que a última é a opção que oferece mais cremosidade à bebida. Em sua opinião, há outra característica que faz a diferença: “é a alternativa que deixa o drink com menos odor”.

A albumina é, de fato, uma proteína existente na clara de ovo. A grande diferença é que a maneira como ela é desidratada elimina qualquer possibilidade de proliferação de bactérias, e isto impede que a bebida fique com ‘cheiro de ovo’ com o passar do tempo.

COMO A ESPUMA SE FORMA?

Agora que já falamos sobre como substituir a clara de ovo nos drinks, resta a dúvida: por que esses ingredientes ajudam a fazer espuma?

Segundo Victor Farinella, articulista do portal Nossa Ciência, “a espuma dos coquetéis pode ser entendida como um conjunto estável de bolhas”. Ele explica que esta estabilidade é conferida por moléculas de ingredientes, como a albumina e a lecitina, que tem partes polares, com afinidade com água e outras apolares, com afinidade por óleos. “Quando a bolha se forma, as partes polares dos elementos, chamados tensoativos ou surfactantes, se aproximam das moléculas de água e as partes apolares ficam para o lado de fora”. Isto forma uma espécie de barreira que protege a bolha, diminuindo a tensão superficial exercida sobre ela.

A imagem acima mostra a superfície de uma bolha. As substâncias tensoativas estão alinhadas de forma que sua região polar (preto) esteja em contato com a água (azul) no interior da bolha e a região apolar ( representado nos riscos vermelhos) fique voltada para fora, diminuindo a tensão superficial exercida sobre o líquido.

Quando agitamos uma mistura contendo ingredientes com substâncias tensoativas, introduzimos ar no líquido, permitindo a formação de bolhas.

“Os tensoativos se alinham na superfície interna e externa da bolha, diminuindo sua tensão superficial e mantendo-a firme por mais tempo”.

Desta maneira, quando mais moléculas como esta existirem no ingrediente, mais resistência é conferida às bolhas da espuma, fazendo com que elas durem mais tempo.

A espuma vista de perto: um aglomerado de pequenas bolhas

Essas moléculas ainda são responsáveis por um fenômeno chamado “Efeito Marangoni”, no qual os surfactantes impedem que a bolha de estique demais e se rompa.

“A redução de grão de bico atua da mesma maneira, pois possui amido e proteínas semelhantes às da albumina e da lecitina em sua composição”, conclui.


Com tantas possibilidades de substituição à clara de ovo em mãos, agora cabe a você, barman, decidir. Que tal deixar de lado as versões in natura e pasteurizada e ter que usar sprays e bitters para disfarçar seu odor, testando uma das alternativas que apresentamos?

Em breve falaremos sobre as técnicas e materiais utilizados para fazer aeração de drinks e explicaremos sobre os diferentes tipos de espuma. Estas e muitas outras dicas sobre coquetéis e novidades sobre o mundo do bar você confere só aqui, no Portal Clube do Barman. Clique e continue a fazer descobertas!

Se você ainda não leu a primeira parte desta matéria, basta clicar:

Como criar espuma para seu drink sem ovos

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