⍟ Primeiro hotel de luxo da Inglaterra ainda em atividade, o tradicional Hotel Savoy, no coração de Londres, acolhe o mais recente balcão premiado como o melhor do mundo. Há mais de 120 anos, ele representa o encontro do melhor entre o antiquado e o moderno na coquetelaria.
Publicado em 18 de outubro de 2017, as 10h.
Um balcão simples, clássico, mas onde todo pequeno detalhe agrega à experiência de bar. Talvez poucos estabelecimentos tenham uma trajetória tão longa e de tanto sucesso como o American Bar, localizado dentro do Hotel Savoy, em Londres. O local foi construído há mais de 125 anos com o objetivo de ser a hospedagem mais luxuosa do país, idealizada pelo empresário Richard D’Oyly Carte.
Hoje reconhecido como o melhor bar do mundo pelo The World’s 50 Best Bars, a casa foi o berço do Hanky-Panky e teve o privilégio de ser capitaneada por grandes head bartenders, como Ada Coleman, Harry Craddock e, mais recentemente, por Erik Lorincz. Sua história remonta a uma Londres antiga, apaixonada por spirits nacionais como o gin e tendências da coquetelaria americana.
É errado pensar que, por funcionar há mais de cem anos, o American Bar parou no tempo. Muito pelo contrário. Sob o olhar cuidadoso de seu head, a equipe está em constante busca por sabores refinados, novas técnicas e inspirações para a carta de drinks luxuosa da casa. Isto sem deixar de lado os clássicos de quem já comandou o balcão no passado, como o Hanky-Panky e o White Lady.
UM BAR AMERICANO EM LONDRES
Pode parecer uma negação da própria nacionalidade, mas fato é que o American Bar recebeu esse nome ainda no fim do século XIX para referir-se à moda americana de preparar cocktails. Naquela época, uma das maiores referência para os profissionais de bar era o mestre Jerry Thomas e, assim, as diferentes combinações de spirits caíram aos poucos no gosto dos ingleses. Se antes os moradores do Reino Unido gostavam de beber doses de gin e whiskies, hoje o paladar está no mais alto nível da coquetelaria.
Com bartenders elegantes, em finos ternos brancos e gravatas pretas, o bar oferece hoje uma vasta carta de drinks chamada Coast to Coast: A Cocktail Journey of Character and Content, inspirada nos sabores, pessoas e paisagens das mais remotas regiões inglesas.
Cada uma das seções do menu é acompanhada de notas do chef de bar sobre gostos e explicações sobre as receitas. São elas: The Garden Of England, Art Deco American Bar, Sherwood Forest, The Pennines e Castle Rock. Além destas, a casa ainda serve seus vintage cocktails, consagrados através de mais de um século de experiência, além de vinhos, champagnes e pratos que harmonizam com o menu.
Barman premiado e reconhecido como um dos melhores do mundo, Erik Lorincz afirma em suas entrevistas que se preocupa em manter a tradição etílica do American Bar, mas sempre pensando em como modernizá-la e aprimorá-la.
SAVOY: SÍMBOLO DE LUXO
O Hotel Savoy foi o primeiro empreendimento do empresário londrino Richard D’Oyly Carte. Em 1889, ele comprou um terreno em Westminster, próximo do Rio Tâmisa, onde construiu uma primeira fase do prédio, que foi ampliado e modernizado ao longo de algumas décadas.
Com mais de 200 quartos, o Savoy foi pioneiro na instalação de rede elétrica em todos os apartamentos, bem como elevadores, além de encanamento apropriado em todas as suítes. Carte contratou o talentoso hoteleiro César Ritz como seu gerente (antes de se tornar um grande empresário do ramo), Auguste Escoffier como chef de cozinha e uma equipe completa de gastronomia francesa. Assim, desde os primórdios de sua operação, o Hotel Savoy e o American Bar ficaram conhecidos pelo alto padrão de qualidade de seus serviços, que até hoje são fonte de inspiração para outros estabelecimentos ao redor do mundo.
ENTRE GUERRAS E VISITANTES FAMOSOS
Sua boa reputação garantiu que o hotel e seus bares não perecessem nas duas guerras que envolveram a Europa no século XX. Na segunda guerra, mais precisamente, o Savoy precisou lidar com racionamento de comida, redução no número de funcionários e visitantes. Mas, após a entrada dos EUA no conflito, a majestade foi recuperada graças à preferência dos norte-americanos pelo local, que atraía empresários, oficiais, diplomatas e jornalistas.
No curso da história, o bar recebeu outros visitantes notáveis, como Frank Sinatra, Oscar Wilde, Charlie Chaplin, Harry Truman, John Wayne, Marilyn Monroe, Elizabeth Taylor, Winston Churchill e os Beatles.
BERÇO DO HANKY-PANKY
Ada Coleman, ou simplesmente Coley, como era chamada por seus clientes mais próximos, foi a segunda bartender a assumir o balcão do American Bar, entre 1903 e 1924. Em uma época em que poucas mulheres comandavam a operação de um grande estabelecimento, Coley era experiente e, antes mesmo de chegar ao Hotel Savoy, já havia trabalhado em outros pubs e no Hotel Claridge, onde começou sua carreira.
Embora o Manhattan tenha sido o primeiro drink que aprendera a fazer – depois de tomar aulas com um garçom – ela aprimorou suas técnicas e ficou conhecida como a criadora de uma série de receitas executadas até hoje, em particular uma, que se tornou a mais icônica: O Hanky-Panky, que foi desenvolvido no balcão do American Bar para um cliente muito especial. A pessoa em questão era o ator e diretor americano Charles Hawtrey. Em 1925, em entrevista à ao jornal People, Coleman disse que o ator foi um dos melhores avaliadores de drinks que ela teve o prazer de conhecer.
“Alguns anos atrás, quando ele estava trabalhando além da conta, veio até o bar e disse: ‘Coley, estou cansado. Me dê algo que tenha pegada!’. Foi por ele que eu passei horas e horas experimentando até inventar um novo cocktail. Na vez seguinte, quando entrou no bar, eu disse que havia criado um drink para ele. Ele deu um gole e disse ‘Por Jove! Isso é um verdadeiro Hanky-Panky’ e desde então o drink é chamado assim”.
Receita: Hanky-Panky
Hanky-Panky
INGREDIENTES
50 ml de Beefeater London Dry Gin
50 ml de vermute rosso
1 dash de bitter italiano digestino
7 ml de suco de laranja
MODO DE PREPARO
Adicione todos os ingredientes a um mixing glass com gelo, misture e em seguida, coe a mistura para um cocktail glass. Guarneça com um twist de laranja (opcional).
HARRY CRADDOCK E THE SAVOY COCKTAIL BOOK
O sucessor de Ada Coleman era tão famoso quanto ela e agregou ainda mais fama ao balcão do American Bar. Em 1925, Harry Craddock assumiu o comando, após sair dos Estados Unidos com o início da Lei Seca americana. Conhecido como o último bartender a preparar um drink no país, afirma-se que ele embarcou em um navio no dia seguinte rumo a Europa, a fim de escapar dos efeitos da Prohibition.
Popular e enigmático, ele não podia deixar sua chegada ao American Bar passar em branco. Por isso, escreveu uma coluna para o jornal The Times afirmando que era o novo chefe de bar do hotel. Criador do White Lady, resolveu esconder uma de suas coqueteleiras com o drink dentro em uma das paredes do bar. Até hoje ninguém a encontrou.
Craddock reuniu todo o seu conhecimento sobre coquetelaria americana, receitas de drinks da casa e suas observações técnicas em um único livro. O The Savoy Cocktail Book, lançado em 1930, ficou conhecido como o livro mais importante de coquetelaria publicado no século passado. No American Bar, ele permanece como o livro de cabeceira de Erik Lorincz e sua equipe. Não à toa, tamanha dedicação e apego aos princípios da arte de criar cocktails garantiram ao Savoy o prêmio de melhor do mundo.
Receita: White Lady (By Harry Craddock)
White Lady
(por Harry Craddock)
INGREDIENTES
40 ml de Beefeater London Dry Gin
30 ml de licor de laranja
20 ml de suco de limão siciliano
MODO DE PREPARO
Adicione todos os ingredientes em uma coqueteleira com gelo. Bata a mistura e coe para um cocktail glass.