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Caipirinha: as possíveis origens do clássico brasileiro centenário

⍟ Cocktails são expressões da cultura etílica de um povo através dos tempos, e com a Caipirinha não foi diferente. Conheça as histórias deste clássico que completou, recentemente, seu centenário

Cachaça, limão e açúcar. A Caipirinha é um drink clássico, uma paixão nacional e talvez um dos cocktails que mais sofrem variações país adentro. Cada um tem o jeito de preparar a sua, mesmo sabendo que a técnica mais correta é fazer a preparação diretamente no copo onde ela será servida. Se a cachaça já era um produto consumido em larga escala nas cidades brasileiras desde a época colonial, você deve estar se perguntando como foi que o drink surgiu. Embarque com o Clube do Barman nesta viagem etílica.

A história da Caipirinha, como a de muitos outros cocktails famosos, não tem uma única e irrefutável versão. São diversos os caminhos que podem ter levado à criação do drink, cada um deles relacionados com momentos interessantes da história brasileira. Um fato, porém, não pode ser ignorado: o Instituto Brasileiro da Cachaça (IBRAC) reconhece que o drink surgiu oficialmente em 1908, durante a epidemia de Gripe Espanhola.

CAIPIRINHA VEIO DO INTERIOR

Uma das versões para o surgimento deste cocktail aponta diretamente para o interior de São Paulo. O limão era cultivado nas lavouras do estado para consumo das famílias e também para abastecer as pequenas cidades no início do século XX. A fruta já era utilizada para o tratamento de resfriados, devido à concentração de vitamina C, por aqueles que faziam caminho Rio de Janeiro – São Paul0, por conta das mudanças de temperatura. Com a chegada da Gripe Espanhola, a busca por remédios caseiros fez com que o consumo dessa bebida crescesse.

Os ‘caipiras‘, ou moradores do interior, faziam uma mistura que levava limão, alho, mel e também a cachaça, que servia apenas como um meio líquido para diluir o medicamento. Após o término da epidemia, os ‘caipiras‘ continuaram bebendo o cocktail que, com o passar dos anos, parou de ser servido com alho, mantendo somente o mel. Eventualmente, ele foi trocado pelo açúcar, mais barato e acessível nos mercados.

limão taiti
O limão usado no preparo do remédio caseiro era o tahiti, cultivado em São Paulo (Foto de Lars H Knudsen no Pexels)

CAIPIRINHA FOI CRIADA POR LATIFUNDIÁRIOS

Esta versão também dá ao estado de São Paulo o título de criador do cocktail. Segundo o historiador Luiz Câmara Cascudo, a elite dos grandes donos de terras agrícolas do estado acabou criando o drink enquanto buscava uma bebida sofisticada que pudesse ser servida nos jantares e eventos sociais no século passado. A cachaça, já conhecida por muitos, era produzida com qualidade na região e foi a escolhida da vez.

A Caipirinha teria rompido a barreira da elite décadas depois, conforme os trabalhadores do campo viajavam para outras regiões em busca de oportunidades de trabalho nas lavouras. Assim, ganhou todo o país.

CAIPIRINHA NASCEU EM PARATY (RJ)

Se você conhece a história do Gimlet, esta versão pode lhe parecer familiar. Pesquisadores afirmam que a Caipirinha possa ter surgido na cidade de Paraty, no Rio de Janeiro, por meio dos marinheiros que passavam pelo local. A cachaça de boa qualidade produzida na região era levada para dentro dos barcos e navios a fim de ser consumida pela tripulação.

Como passavam muitos dias no mar e nem sempre podiam levar consigo vitaminas e alimentos frescos (lembre-se, estamos falando do início do século XX), eles misturavam a cachaça com limão para combater o escorbuto, doença muito comum entre os marinheiros pela deficiência de vitamina C.

De tão consumida, a bebida caiu no gosto dos homens que desembarcavam em Paraty. Por isso, eles a levaram para dentro dos bares da cidade, que depois começou a vendê-la para os clientes.

A cidade de Paraty ficou muito conhecida por sua produção de cachaça (Foto:Vani Ribeiro/Wikipedia CC BY-SA 3.0)

CAIPIRINHA NASCEU EM SANTOS (SP)

Alguns historiadores, porém, apontam que o drink pode ter nascido na cidade de Santos, no litoral de São Paulo. Historiadores justificam essa hipótese porque o primeiro engenho de açúcar, necessário para a produção da cachaça, teria surgido nas imediações da cidade. Na região dos morros santistas ficava uma antiga destilaria de cachaça artesanal, que abastecia pequenos bares e comércios locais.

O cocktail pode ter surgido durante o enfrentamento da Gripe Espanhola, permanecido nas sombras, e despontado como uma grande sensação apenas nos anos 50, em grandes restaurantes e hotéis da cidade.

CAIPIRINHA INVENTADA POR DETETIVE

Que história é essa? Calma, dessa vez é pura ficção! No livro O Xangô de Baker Street, de Jô Soares, Sherlock Holmes e Watson vêm ao Brasil para investigar o sumiço do valioso violino Stradivarius, que foi um presente do imperador D. Pedro II à baronesa Maria Luíza.

Andando pelas ruas do país, quente e úmido, Sherlock sente-se mal e vai até uma espécie de boteco para pedir uma bebida que o ajudasse a recuperar-se da hipoglicemia. A cachaça, então, é oferecida a ele como um ‘bom remédio matutino’. Porém, Watson sente o aroma e o julga muito forte. Ele sugere, então, adicionar um pouco de suco de laranja ou limão, que ajudam no combate do escorbuto. Depois, sugere colocar um pouco de gelo e açúcar para aliviar a sensação de calor do álcool. Ele coloca tudo em um copo, amassa os limões, agita rapidamente e experimenta.

Os funcionários do estabelecimento observam estarrecidos, sem entender o que os homens estavam preparando. E um deles pergunta qual foi o caipira que criou aquela bebida e o segundo responde ‘o caipirinha’, se referindo a Watson, mais baixo do que Sherlock.

O elemento cômico está na adição de gelo à Caipirinha, uma vez que não existiam congeladores na época.

CAIPIRINHA PRECISA SEGUIR LEI?

Sim e não. Explicamos: como se trata de um drink que representa a identidade brasileira mundo afora, é necessário que ele siga alguns padrões para que seja considerado uma autêntica Caipirinha. Afinal, a Caipirinha também integra a lista de clássicos da International Bartenders’ Association (IBA).

Em dezembro de 2001, o então presidente Fernando Henrique Cardoso assinou o decreto Nº4.062, que estabelecia a Caipirinha como um dos símbolos nacionais e tinha a seguinte composição: cachaça, limão e outros ingredientes – deixando uma brecha para possíveis mudanças na receita.

Para delimitar a receita da Caipirinha original como produto brasileiro, o presidente Luís Inácio Lula da Silva publicou um novo decreto (Nº6.781), afirmando que o cocktail era composto somente de cachaça, limão, gelo e açúcar – como conhecemos e servimos diariamente no bar. Tal decreto, que ficou conhecido como ‘Lei da Caipirinha’, trazia também outras especificidades, como: “ 5º A bebida prevista no caput, com graduação alcoólica de quinze a trinta e seis por cento em volume, a vinte graus Celsius, elaborada com cachaça, limão e açúcar, poderá ser denominada de caipirinha (bebida típica do Brasil), facultada a adição de água para a padronização da graduação alcoólica e de aditivos”.

Você já se perguntou quais são as principais diferenças entre a cachaça, base da Caipirinha, e o rum? Saiba mais sobre o assunto nesta matéria:

Diferenças entre rum e cachaça: quatro pontos essenciais

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