⍟ Antes de beber seu primeiro drink na vida, Jessica Sanchez já sabia o que queria ser: bartender. Atrás da barra, empregou sua visão acolhedora do mundo e aliou à coquetelaria carioca
Publicado em 05 de março de 2018, às 10h.
Jessica Sanchez se apaixonou pelo mundo coquetelaria na primeira vez que sentou em frente um balcão. Isso não aconteceu na sua adolescência, ao lado dos pais, como em tantas outras histórias de amor entre bartenders e as cores, formas, movimentos e a mágica de seu ofício.
O encontro aconteceu apenas aos 20 anos de idade, quando trabalhava em um restaurante em São Paulo como sommelier de vinhos. “Eu não bebia nada. Só colocava na boca, experimentava e cuspia”. Até então, ela não havia bebido sequer um drink na vida por motivações pessoais. Mas, se para tornar-se bartender ela tivesse que experimentar cocktails e conhecer a potência dos spirits, ela estava aberta à mudanças.
Prestes a atualizar o cardápio do restaurante, Jessica e outros funcionários participaram de um treinamento que envolvia coquetelaria. Seu fascínio pela profissão começou ali. “Vi os barmen fazendo drinks e me apaixonei na hora. Decidi começar a estudar, buscar livros, informações na internet e fui procurar emprego na área”, lembra.
Mas, até aquele momento, o mercado não se mostrava fácil para mulheres. “Era difícil porque não trabalhavam com mulheres. Era um trabalho bastante pesado e não tinha muito consumo de cocktails nos bares como hoje. Era preciso carregar barris, sacos de gelo e não costumavam colocar mulheres para fazer esse serviço”.
“Era difícil porque não trabalhavam com mulheres. Era um trabalho bastante pesado e não tinha muito consumo de cocktails nos bares como hoje. Era preciso carregar barris, sacos de gelo e não costumavam colocar mulheres para fazer esse serviço”.
NA NOITE PAULISTA
Sua primeira vez atrás da barra foi numa boate paulista como lavadora de copos. Lá, passava quase todo o expediente na pia, mas podia atender o balcão quando não tinha trabalho para fazer. Ela lavava tudo com rapidez para poder ter contato com os clientes e aprimorar suas noções de hospitalidade – vital para quem, como ela, se dedicava ao ramo de bares e restaurantes.
Em seguida, buscou seu primeiro trabalho como bartender em um pub prestes a abrir na Avenida Faria Lima. No caso, tratava-se do The Sailor Legendary Pub e outra bartender, Talita Simões, era quem estava a cargo da seleção. Jessica não esconde a gratidão pelas portas abertas e pela experiência: “Ela me ensinou a base de tudo que eu sei. Depois do pub, fui para outro restaurante que ela também estava trabalhando”.
Seu último emprego na capital paulista foi no Absolut Inn, casa pop-up de Absolut Vodka que tomou conta da Rua Oscar Freire entre outubro e dezembro de 2012. Era uma mistura de bar, balada e ateliê de exposições.
TERRENO FÉRTIL
No fim de seu período na Oscar Freire, Jessica recebeu um convite para trabalhar no Meza Bar, no Rio de Janeiro. Entre os dois polos da coquetelaria, a bartender preferiu se mudar para a capital fluminense com o intuito de realizar o sonho de estudar e trabalhar – o que era impossível conciliar em São Paulo, segundo ela. “Só conseguia aprender no dia a dia do trabalho, não podia fazer cursos porque morava muito longe. Quando eu vim para o Rio, morava do lado do meu trabalho e sobrava mais tempo para me especializar”.
Jessica Sanchez ficou por dois anos atrás da barra do Meza, point da boa coquetelaria e gastronomia carioca, no bairro do Humaitá. Com cursos de mixologia, design de cocktails e prática de sobra, decidiu alçar voos maiores rumo à Europa. Durante nove meses, conheceu os melhores bares, seus cardápios, ingredientes e adquiriu o know how europeu. Sua dedicação foi reconhecida prontamente. Quando voltou ao Brasil já tinha um novo desafio: ser chefe de bar no Copacabana Palace.
No total, o hotel cinco estrelas tem quatro bares: um dentro de cada restaurante e outro na piscina, cada um com proposta e cardápio próprio. De início, a função de chefe de bar era muito engessada porque não permitia que ela criasse receitas, apenas as executava. Depois, passou ao cargo de gerente de bar, que contribuiu muito para o trabalho que desenvolve hoje.
“O legal é que trabalhar em hotel envolve burocracia, relação com os clientes, parcerias e funções administrativas que são difíceis para um bartender de restaurante ou de bar dominar e exercer. É uma habilidade que a gente tem, mas de maneira bem deficiente. Foi algo que eu aprendi lá e que acrescentou na minha carreira”, avalia.
Seu trabalho envolvia ainda questões rígidas de controle de budget e as avaliações de Leading Quality Assurance (LQA), responsáveis por classificar o serviço dos hotéis com estrelas. “Você tem 30 segundos para notar que o cliente esta lá, dois minutos para entregar o cardápio e por aí vai. São aspectos de atendimento cinco estrelas que eu não conhecia e que fazem com que a experiência do cliente seja boa”.
Ela afirma que também precisou se adaptar aos drinks e sabores de um hotel internacional. “Foi providencial produzir cocktails diferentes, pois muita gente acaba produzindo somente o que gosta de beber. Isso é beber, e não ser bartender. Isso não é servir o cliente”, defende. “Aqui as pessoas consomem muitas coisas diferentes e preferem criações mais frutadas. É necessário equilibrar para que não seja uma bebida tão forte. Aprendi que a experiência das pessoas é o mais importante”, diz.
A CHEGADA DO VIZINHO
Em 2016, com uma série de consultorias e anos de experiência na bagagem, Jessica decidiu dar o início a uma nova empreitada. No próprio Vogue Square – shopping conceito na região da Barra da Tijuca, com projeto assinado por arquitetos da Casacor -, onde já havia treinado funcionários e criado menus para restaurantes anexos, viu a oportunidade de construir sua própria barra e colocar atrás dela tudo o que acreditava ser importante em um bom bar.
“Eu e meu marido já tínhamos a ideia de ter um bar de coquetelaria em que eu só assinaria a carta, mas surgiu a oportunidade de comprar o espaço”, diz. Nasceu, então, o Vizinho Gastrobar. O nome faz referência à relação pessoal que temos com quem vive próximo da gente, que nos ouve, mas não julga; que faz parte da nossa vida, mas não em excesso. A casa trabalha com carta flexível e estimula a criatividade de seus clientes, além de priorizar insumos artesanais.
Outro diferencial é que o Vizinho oferece opções de drinks sem álcool com bastante personalidade para aqueles que não podem beber ou optam por não fazê-lo, promovendo o consumo responsável entre os clientes.
“Estamos criando a primeira franquia do bar na Zona Sul do Rio. A ideia é ter outros vizinhos pelo Brasil. Estamos prospectando mais”, finaliza. Em 17 de novembro do ano passado, a casa completou um ano de funcionamento.
Have a Great Sour
(por Jessica Sanchez)
INGREDIENTES
45 ml de Absolut Vodka
10 ml de Chartreuse
15 ml de licor de cereja com brandy e melissa
20 ml de suco de limão tahiti
20 ml de clara de ovo