⍟ Na primeira parte da matéria você entendeu um pouco sobre o que é destilação e como é feita a primeira parte do processo, que consiste na fermentação. Agora, conhecerá a importância do alambique
Todo licor – de vodka a whiskey irlandês, passando pelo cognac, tequila e aguardente de root-beer – começa sua vida como uma espécie de vinho ou cerveja; em outras palavras, como uma bebida fermentada. A destilação não é capaz de criar álcool; apenas o concentra. No processo, deixa muita água (e agora água livre de bactérias), além de outros nutrientes e sabores. Agora você entende um pouco sobre o primeiro método de destilação de que se tem registos na história.
O ALAMBIQUE
Durante a maior parte da história, os alambiques que fizeram essa concentração eram dispositivos simples, consistindo em algum tipo de panela à prova de fogo para segurar o “wash” (o líquido com álcool sendo destilado). No topo da panela, uma tampa bem ajustada, projetada para capturar o vapor rico em álcool que sobe do “wash” quando é aquecido. Logo acima dela, um dispositivo que recolha o vapor e envie para outro que o esfrie o suficiente para que se condense e volte à forma líquida. Este líquido é então movido para um recipiente separado, ou reservatório de retenção.
Um destilador do tipo alambique é, verdade seja dita, praticamente como qualquer outro. Os topos de condensação, no entanto, são o diferencial. Historicamente, eles variam em forma, dependendo de onde e quando se originaram. Existem três tipos básicos: o indiano, o do Oriente Médio e os chineses. O relacionamento histórico entre eles é obscuro, e questões como ‘qual veio primeiro’ e se eles se influenciaram mutuamente ainda carecem de respostas definitivas.

Dito isso, baseado em evidências arqueológicas descobertas na década de 1960 em uma parte do subcontinente indiano em que hoje fica o Paquistão, o estilo indiano parece muito provavelmente o mais antigo, datando de 500 a 300 a.C.. Também conhecido como “cabeça de elefante”, assume a forma de uma grande lâmpada de cerâmica com uma abertura no fundo para caber sobre a boca da panela e um tubo inclinado para baixo saindo de um lado. O vapor passa para a cabeça bulbosa e começa a esfriar, move-se através do tubo para outro recipiente, provavelmente resfriado por água corrente, condensando novamente em líquido. Os arqueólogos descobriram instalações com um grande número desses equipamentos, indicando que a destilação em escala comercial já acontecia séculos antes de Cristo.
O estilo do Oriente Médio é semelhante ao indiano, exceto que a cabeça é grande o suficiente para permanecer relativamente fria quando a panela é aquecida, de modo que o vapor se condense em sua superfície interior e escorra pelas laterais, onde é coletado por uma calha interna e carregado por um tubo. Documentado pela primeira vez entre os gregos que vivem no Egito por volta do século I d.C., é possível que, na antiguidade, tenha sido usado para destilar o vinho, mas, se assim fosse, era um segredo bem guardado, e as evidências disso são bastante ambíguas.

Os árabes, que o adotaram após a conquista do Egito nos anos 600, usaram a destilação não com o propósito de concentrar álcool para consumo, mas para a produção de remédios e perfumes. O fato de Mohammed e o Alcorão terem explicitado a noção de que “o homem justo não bebe vinho” ou qualquer outro tipo de álcool pode ter algo a ver com isso.
No entanto, estudiosos, alquímicos e médicos muçulmanos proeminentes do período entre 900 e 1100 d.C., em particular Geber e Avicenna, fizeram muitas experiências com a tecnologia de destilação e escreveram sobre isso com frequência em seus livros e ensaios, alguns dos quais existem até hoje.
Finalmente, há o estilo chinês, que pode ter sido o último a surgir – aparentemente datado do século V a.C. – mas dentro de um século mais ou menos estava sendo usado para produzir destilados em quantidades comerciais, a partir tanto de uvas quanto de grãos. Em sua forma básica, a cabeça de alambique chinesa é apenas uma tigela em forma de wok que se fecha no topo da panela. Quando cheia de água fria, o vapor ascendente se condensa na parte inferior e escorre até o ponto mais baixo. Nas versões mais simples, o líquido é coletado numa tigela colocada em um suporte dentro da panela. Versões mais sofisticadas drenam a tigela para dentro de um tubo que escorre pela lateral do alambique.
DESTILAÇÃO NA EUROPA

Muito provavelmente a destilação do álcool não começou na Europa antes dos anos 1100, e foi iniciada provavelmente entre os árabes que moravam na Espanha (os mouros islâmicos ocuparam a Espanha entre 711 e 1492 d.C.) ou pela comunidade de estudiosos-monges-médicos cristãos reunidos no porto de Salerno, no sul da Itália. Não sabemos que tipo de alambique eles usavam – provavelmente era o do Oriente Médio. Na época, a Europa também tinha muito contato com a China. Nos anos 1300, é sabido que ainda usavam o estilo do Oriente Médio e uma adaptação que o aproximava do estilo indiano original.
Este último era um equipamento todo em cobre, onde o recipiente era encimado por uma cabeça bulbosa com um tubo de saída curvo que lembra um pescoço de cisne, anexado a uma bobina de cobre resfriada a água (uma invenção italiana) para condensar o vapor, e estavam espalhados por toda a Europa. Os europeus do norte destilavam cervejas à base de grãos, enquanto os do sul da Europa destilavam uvas e vinhos de frutas.
Por volta de 1500, os italianos usavam destilação para fazer licores de ervas (para fins medicinais) e brandies (para fins de ‘uhul’), os franceses para fazer cognac de uva, os europeus orientais para fazer vodka, aguardente alemã, whisk(e)y irlandês e escocês, e os alemães e holandeses sua genebra com sabor de zimbro. De fato, tirando ou pondo pouca coisa, é o mesmo alambique, na maioria das vezes feito de cobre, usado até hoje para fazer cognac, Single-malt Scotch e uma série de outros destilados.
EQUIPAMENTO ORIENTAL RUDIMENTAR NO MÉXICO

Há uma parte do mundo ocidental, no entanto, em que o estilo chinês ainda é usado: nos anos 1500, os marinheiros filipinos que trabalhavam em navios espanhóis o introduziram no México, onde foi usado para destilar conhaque de coco e mezcal. Em algumas partes de Oaxaca, os alambiques de estilo chinês permanecem em uso até os dias de hoje, dentro de fábricas de argila e bambu que parece que vão desmoronar se a gente tropeçar nelas sem querer.
Veja a terceira parte desta matéria aqui:
Saiba como é feita a destilação – Parte III – A coluna contínua